Reproduzido de Jornal da Ciência. Edição 7101. 23 de janeiro de 2023. Disponível em: http://www.jornaldaciencia.org.br/edicoes/?url=http://jcnoticias.jornaldaciencia.org.br/23-mais-de-70-das-bolsas-do-cnpq-nao-tem-reajuste-ha-quase-13-anos/&utm_smid=10352664-1-1
“O futuro da ciência no País depende da valorização dos nossos pesquisadores. Esta valorização passa pela recomposição do valor das bolsas”, escreve Odir Dellagostin, presidente do Confap e membro do Conselho Deliberativo do CNPq
O CNPq é a principal agência de fomento à pesquisa do país. Ao longo dos seus mais de 70 anos de existência, vem promovendo importantes investimentos que têm contribuído para o avanço científico e tecnológico do país. Um dos principais instrumentos de fomento à pesquisa é a concessão de bolsas de diferentes modalidades, desde a bolsa de iniciação científica júnior, no valor de R$ 100,00 por mês, para estudantes do ensino médio, até bolsa de especialista visitante, no valor de R$ 14.000,00 por mês, destinada a atração de profissionais altamente qualificados para o fortalecimento de grupos de pesquisa.
Atualmente, o CNPq possui 27 modalidades de bolsa, contemplando aproximadamente 79 mil bolsistas, segundo dados disponíveis em http://dadosabertos.cnpq.br/pt_BR/organization/cnpq. A modalidade com maior número de bolsistas é de iniciação científica (IC), com aproximadamente 28 mil bolsas vigentes, seguido pela bolsa de produtividade em pesquisa – PQ, com 15.170 bolsas e pela modalidade de IC júnior, com 13.200 bolsas vigentes. As bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado contabilizam 6.600, 4.300 e 808, respectivamente. Estas três modalidades representam 15% dos bolsistas do CNPq.
Nos últimos meses, tem havido esforços para encontrar uma forma de reajustar o valor das bolsas, pois no caso das bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado, o último reajuste ocorreu em abril de 2013, ou seja, há quase 10 anos. O gráfico abaixo mostra o valor das bolsas de mestrado e doutorado, corrigido pela inflação, ao longo dos últimos 28 anos.

Constata-se que a defasagem de abril de 2013 a dezembro de 2022, segundo o IPCA, índice que mede a inflação, alcança 76,3%. Em recente manifestação, o Ministro da Educação, Camilo Santana informou que até o final do mês de janeiro deverá ser anunciado o reajuste das bolsas da Capes e do CNPq. O percentual buscado é de 40% de reajuste, o que é bastante expressivo, porém, não é ainda suficiente para recompor integralmente o valor da bolsa de 2013.
No entanto, no caso do CNPq, 85% das bolsas estão com uma defasagem ainda maior, pois o último reajuste ocorreu em março de 2010, por meio da RN-005/2010. É preocupante a situação de mais de 32 mil bolsistas de IC e iniciação tecnológica (IT), que recebem R$ 400,00, ou dos mais de 13 mil estudantes do ensino médio que recebem bolsa de IC júnior, no valor de R$ 100,00 por mês. Estes bolsistas precisam dedicar no mínimo 8 horas por semana em atividades de pesquisa para fazer jus à bolsa. Esta bolsa deveria servir de atrativo para que jovens cientistas tomassem gosto pela ciência, independente da carreira que viessem a seguir após a conclusão da formação acadêmica. Num passado não muito remoto, o valor da bolsa de IC superava o do salário mínimo. Atualmente, corresponde a menos de um terço do salário mínimo, como pode ser observado no gráfico abaixo. As consequências desta defasagem são sentidas nos grupos de pesquisa e têm reflexos negativos na produção científica, no desenvolvimento tecnológico e na inovação.

Igualmente preocupante é a falta de reajuste das demais modalidades de bolsa. Os 15 mil pesquisadores que recebem bolsa PQ ou DT, bem como os quase 5 mil que recebem outras modalidades de bolsa, não têm qualquer reajuste há quase de 13 anos. A inflação acumulada até dezembro de 2022 alcançou 110,2%. Isso significa que os valores atuais correspondem a menos da metade do valor que as bolsas tinham no final do segundo mandato do presidente Lula. Precisamos urgentemente reverter esta situação.
As Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (FAPs) se anteciparam e já reajustaram suas bolsas em percentuais que vão de 20 a 40%. Um reajuste linear de 40%, sugerido por integrantes do GT de transição será um alento, mas estará ainda distante do desejável. Além disso, é necessário rever os valores, pois alguns são absurdamente baixos para a qualificação exigida e a função que é esperada do bolsista. O futuro da ciência no país depende da valorização dos nossos pesquisadores. Esta valorização passa pela recomposição do valor das bolsas.
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